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segunda-feira, 1 de maio de 2017


Os bons nos deixam!

Preciso falar de Belchior.

Minha ligação com ele é bem intensa. Inexplicável. Desde quando eu o ouvia criança. Os seus versos sempre me chamavam atenção... Coisas como "Tava mais angustiado do que um goleiro na hora do gol", "Se você vier me perguntar por onde andei no tempo que você sonhava/ De olhos abertos, eu lhe direi: amigo, eu me desesperava" e "Você não sente e nem vê, mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo: que uma nova mudança em breve vai acontecer".

Por conta da canção Velha roupa colorida, quis ler Poe, que ele citava na letra. O grande Edgar Allan Poe e seu Corvo.

E lembro de uma peça que meu pai escreveu sobre juventude e tinha uma rubrica interessante: "ao som de Como nossos pais em 45 rpm". Eu sempre ficava imaginando esta música em ritmo acelerado como meu pai sugeria.

Pois bem, Belchior seguiu me acompanhando. Como Renato Russo disse uma vez que a relação dos fãs com as canções da Legião Urbana era como se elas fossem amigas, assim considero as canções do Belchior que sempre pareciam dialogar comigo, me acalentado.

Quando tomei uma grande decisão na vida, que foi morar no Rio de Janeiro, em 1997, coincidentemente os Engenheiros do Hawaii lançaram uma versão da canção Alucinação, do Belchior (cujo disco do mesmo título, lançado em 1976, meu padrasto tinha e que eu não me cansava de ouvir).

O que sei é que Alucinação seguiu me acompanhando naquele ano de 1997. Os versos da canção me disseram e me dizem muito, até hoje. "Eu não estou interessado em nenhuma teoria/ em nenhuma fantasia nem no algo mais (...) amar e mudar as coisas me interessam mais, muito mais".

Em 1998, eu estava no outro apartamento que eu morava em Copacabana, muito deprimido, longe da família que morava em Belém, sem dinheiro e com saudade de um grande amor... Acho que era uma tarde de julho, pelo frio que fazia. Resolvi colocar um CD do Belchior para tocar. Passei por canções como À palo seco, sentindo o coração transbordar... E pensava na minha condição de estrangeiro no Rio de Janeiro, de um cara do Norte que vem pra Cidade Grande... Aí toca Retrato 3 X 4, onde os versos me atingiram em cheio... Parecia que ele tava sendo o amigo que eu precisava naquele instante:

"Eu me lembro muito bem do dia em que eu cheguei
Jovem que desce do norte pra cidade grande (...)
Pois o que pesa no norte, pela lei da gravidade,
disso Newton já sabia! Cai no sul grande cidade (...)
Mesmo vivendo assim, não me esqueci de amar (...)
mas a mulher, a mulher que eu amei,
não pode me seguir ohh não (...)
A noite fria me ensinou a amar mais o meu dia
e pela dor eu descobri o poder da alegria
e a certeza de que tenho coisas novas
coisas novas pra dizer
a minha história é ... talvez
é talvez igual a tua, jovem que desceu do norte
que no sul viveu na rua
e que andou desnorteado, como é comum no seu tempo
e que ficou desapontado, como é comum no seu tempo
e que ficou apaixonado e violento como você
Eu sou como você. Eu sou como você. Eu sou como você
que me ouve agora. Eu sou como você. Como Você".

Não preciso nem dizer o quanto chorei naquele momento... O cara ali, dizendo as coisas que eu precisava ouvir. Batendo certeiro na minha dor!

Pois é, choro agora um pouco mais... Lembrando do artista Belchior, um cara que saiu do Ceará e dormiu nas ruas do sudeste, mesmo assim sonhou, acreditou e fez com que a sua poesia ecoasse e permanecesse viva até os dias atuais, inspirando outros novos jovens. "PRECISAMOS TODOS REJUVENESCER"

Valeu, Belchior, obrigado por tudo!