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terça-feira, 19 de abril de 2011

Ligeiras anotações sobre humor - por Raul Franco

Esse texto eu comecei esboçá-lo em 2003, acho. Quando eu estava num processo dolorido de montagem de um espetáculo meu - que era uma comédia. Mas a coisa estava bem difícil, já que muitos atores estavam conduzindo o texto de uma maneira desastrosa (risos). Como nada é em vão, eu comecei a pensar, no silêncio do meu quarto, o que eu realmente queria e defendo como comédia. Nunca postei esse texto ou publiquei. Ele ficou guardado esse tempo todo. E hoje acabei o encontrando no meu computador. E resolvi separar os esboços em tópicos. Muitos parágrafos eu os reescrevi, porque estavam mal escritos mesmo. Agora divido com vocês, que fazem comédia ou, simplesmente, apreciam. Façam bom proveito!


Ligeiras anotações sobre o humor –
Afinal, o que é isso que nos faz rir?

Ou

Pequena tese sobre comédia, segundo Raul Franco

        TÓPICO 1 - Vamos levar o humor a sério

Eu penso o humor como algo extremamente sério. Pode parecer brincadeira, mas o humor, pra mim, deve ser encarado assim. Seriedade, no sentido da missão que você tem. E, principalmente, pensar no humor como uma ferramenta necessária para desencadear a válvula de escape das pessoas. Então, posso dizer que o riso nasce dessa libertação do estresse. Se ele foi embora, logo você pode dar aquela gargalhada que te relaxa.

Detesto o humor que se pauta no histrionismo, onde os atores gritam, fazem gestos grosseiros, tentando, em um ato desesperado, extrair uma graça. O tentar fazer graça é sempre um precipício do qual devemos fugir como o diabo foge da cruz. O ator que entra em cena, pensando: “Vou fazer todo mundo rir”, está fadado ao fracasso, pois humor que é humor, surge espontaneamente, sem se forçar.

         TÓPICO 2 - Atores cômicos

Existem atores que são extremamente engraçados fora de cena, mas quando estão em cena não funcionam muito. Porque, muitas vezes, ele já vai pensando em fazer humor, o que mata a sua graça. Por outro lado, existem atores mais reservados, tímidos até, que se revelam em cena, fazendo a plateia gargalhar com a sua atuação, não porque ela foi medíocre, mas porque foi espetacular. Esse ator leva o humor a sério. Não é uma vedete qualquer que faz do seu rebolado a tentativa desesperada de seduzir pelo grotesco.

       TÓPICO 3 – a) Como em qualquer gênero, o ator cômico deve se aprimorar


 Se eu uso o termo “sério” é porque acredito mesmo nessa ideia de se encarar o humor com seriedade, não no sentido de superestimar o humor, mas no sentido de usar pesquisas necessárias, como em qualquer outro gênero, para conseguir o resultado em cena, ou seja, fazer rir. Atores da commedia del’arte faziam isso. Interpretavam a vida inteira o mesmo personagem. Exercitavam diariamente o corpo e a voz com o intuito de obter uma performance satisfatória. Para isso, faziam anotações diárias nos seus caderninhos, conhecidos como zibaldones, e se empenhavam arduamente na pesquisa das características dos personagens que estavam interpretando. Isso sem falar na capacidade de improviso que eles desenvolviam, porque, em sua maioria, as comédias eram improvisadas. Dava-se um tema e os atores improvisavam em cima, uma ou outra cena era escrita.
  
       TÓPICO 3 – b) Charles Chaplin e a criação do seu Carlitos

Por falar em interpretar um personagem a vida inteira, não podemos esquecer Charles Chaplin e seu eterno Carlitos. O nome do personagem surgiu a primeira vez em um filme chamado Carlitos Repórter, de 1914 – o primeiro filme feito para a companhia Keystone Comedy Film. Mas o Carlitos que ele representou neste filme, que era mau-caráter e canastrão, é completamente diferente do Carlitos que se tornou conhecido mundialmente. O mais interessante foi como Chaplin o concebeu. Pensando em criar um tipo bem diferente e original, ele começou a pensar em alguns ingleses, observados por ele na infância, que andavam pelo subúrbio londrino. Eram baixos, tinham bigodinhos pretos, usavam roupas bem justas e tinham sempre à mão uma bengalinha feita de bambu. Daí nasceu a chave para se criar tal personagem. Para tanto, ele resolveu, ao compor o “novo” Carlitos, utilizar elementos contraditórios que desencadeassem o humor. Então, usou calças largas com um casaquinho apertado e sapatos maiores que os seus pés e, é claro, a famosa bengalinha. Estava pronto um personagem engraçadíssimo que influenciou e influencia até hoje diversos comediantes. A ideia do vagabundo com a alma de aristocrata é encantadora e atravessou os tempos. O humorista Renato Aragão, por exemplo, fez uso dessa imagem em seus filmes e programas de TV.

         TÓPICO 4 – Fazer humor é como acenar com o falso óbvio

Dentro dessa viagem do humor, eu o defino com uma ideia que tenho na cabeça o tempo todo de que fazer humor é acenar com o falso óbvio. Ou seja, você pensa que o personagem vai fazer uma coisa e ele faz outra. É o drible que serve como um “tapa” que faz rir. É esse falso óbvio que proporciona o riso. Por isso, você ri do cara que cai na rua. Porque ninguém espera que, de repente, alguém caia, andando normalmente. O riso nasce do susto.




        TÓPICO 5 – O desfecho da piada

Outra questão importante que penso e que aprendi com Chico Anysio, é que o importante numa cena de humor é o desfecho, assim como uma piada. O desfecho tem uma importância crucial. Então, levando em conta essa ideia, passei a pensar as minhas cenas curtas, esquetes de humor, começando pelo final. Primeiro eu tentava saber como acabaria uma determinada cena. Depois, ao criar um final que fosse realmente interessante, eu ia pro início. E isso acabou se tornando um exercício maravilhoso para mim.

TÓPICO 6 – O ator não precisa ser engraçado 24 horas!

Retomando uma questão inicial, presente nesse texto, e mais voltada para a interpretação dos atores, é necessário dizer que nem sempre aquele ator que não é engraçado no cotidiano está impedido de fazer rir. Muitos conseguem ter bons resultados em cena. Outros, não. E se o ator não é muito engraçado, podemos apelar para um humor técnico, calcado na repetição de movimentos, gestos e entonações vocais. Porque humor também não é só o ator estar em cena, esbanjando espontaneidade. Ele pode ter a técnica que consiga desencadear o humor. O que é interessante muitas vezes.

          TÓPICO 7 – Humor absurdo

Também acho extremamente interessante a ideia de se fazer humor de forma séria, sem tentar fazer graça, conforme falei no começo. Nesse caso, divirto-me muito com os filmes de humor absurdo, realizados por Jerry Zucker, Jim Abrahams e David Zucker. Filmes como Apertem os cintos... o piloto sumiu (1980, dirigido pelos três), Top Secret (1984, dirigido pelos três), a série Esquadrão de polícia que originou o filme Corra que a polícia vem aí (1991, dirigido por Zucker) e suas hilárias continuações Corra que a polícia vem aí 2/2 e Corra que a polícia vem aí 33 1/3. Isso sem falar em Top Gang – Ases muito loucos (1991, dirigido por Abrahams). Gosto muito da utilização da meta-linguagem presente nas sátiras de outros filmes. E, principalmente, o modo como as interpretações são conduzidas – os atores, muitas vezes, falam o texto de modo muito sério, sendo que o que estão dizendo é a maior bobagem do mundo. Aí, percebemos algo que também já foi suscitado nesse texto, como a utilização de elementos contraditórios, ou seja, o sério e a bobagem, como desencadeadores do humor, porque o formato, a embalagem transformam aquilo que está sendo dito em algo extremamente engraçado.

Outra questão muito presente nos filmes e que também tem a ver com os elementos contraditórios, é o fato de esses filmes usarem constantemente a ideia de figura e fundo, isto é, temos uma imagem na frente, tida como a principal, e outra que se encontra lá no fundo. E, às vezes, a imagem do fundo acaba contradizendo tudo aquilo que está sendo dito pela imagem principal. O que também proporciona o humor.


        TÓPICO 7 – A comédia na TV (coisas que me influenciaram)

Falando de humor, não posso deixar de citar duas figuras importantíssimas da televisão brasileira, responsáveis por programas inovadores, como TV Pirata e Comédia da Vida Privada. Estou falando, é claro, de Guel Arraes e João Falcão. TV Pirata, por exemplo, satirizava comerciais e programas de TV, fazendo uso também de metalinguagem o tempo todo. Inclusive, foi acusado por muitos críticos na época de estarem fazendo um humor elitizado demais. Por outro lado, o Comédia, partindo dos textos de Luís Fernando Veríssimo – um mestre do humor brasileiro -, conseguiu radiografar um pouco da classe média brasileira ao apresentar a sua intimidade. Dois programas que traziam atores excelentes e textos inteligentes. Duas combinações bombásticas para se fazer humor.  

       TÓPICO 8 – O mau ator engana no drama. Mas na comédia não

Já que falei de atores excelentes, vale dizer que um mau ator pode enganar, fazendo um drama, agora jamais engana, fazendo comédia, porque para fazer drama, basta pôr uma canção triste ao fundo, baixar um pouco a luz, fazer com que o ator fale mais pausado e pronto, logo se faz chorar. Ou seja, fica fácil se maquiar uma cena dramática. Agora a comédia bate em uma questão muito importante: o timming. Poucos atores têm timming de comédia. E para se fazer rir, é preciso muito timming. A piada tem um tempo, seja na forma como você diz o texto, seja na forma como você silencia, dá a pausa. É preciso uma atenção redobrada para dizer o texto na “batida” certa. Se você não disser o texto no tempo certo, perdeu a piada. Por isso, em muitas vezes, não se consegue repetir uma piada em todos os dias de execução de uma peça teatral. Um dia, você consegue, no outro dia, não. Então, cabe se exercitar diariamente, atentar para a forma como aquilo deve ser dito para gerar o riso.


      TÓPICO 9 – O texto do humor como uma partitura

O texto de humor, como qualquer outro texto, deve ser entendido como uma partitura. Assim, como um grande pianista pega uma partitura musical e vai tocar de forma surpreendente, com swing, um músico medíocre pode pegar a mesma música e destruí-la por completo, tocando de forma quadrada. Assim se dá com as interpretações. Um grande ator pode não perder nenhuma piada do texto e, melhor ainda, descobrir outras que passavam despercebidas. Ele sabe o tempo certo de pausar, de dar o texto. E, mais importante ainda, ele sabe o tempo que deve esperar pelo riso da plateia. Porque também é extremamente importante dar um tempo para a plateia rir. E ouvindo uma vez o Jô Soares falar sobre isso, aprendi uma coisa preciosa: não se deve falar no meio do riso da plateia. Nem esperar pelo fim do riso. O riso é explosivo e depois tem uma curva descendente. Então, é necessário que esperemos o momento em que o riso entra nessa curva descendente para dar prosseguimento ao texto, gerando, quem sabe, uma nova piada.

       TÓPICO 10 - Comédia x Drama

A plateia pode ser enganada em um drama, ou melhor dizendo, ao fazer um drama não podemos saber de imediato se a plateia gostou ou não. Já na comédia, a resposta vem imediatamente: se o público rir, é porque está gostando; se não rir, a comédia tem problemas. Se bem que acredito que existem comédias que fazem um humor mais cerebral (como os filmes de Woody Allen que eu adoro). A plateia pode estar gostando muito, assistindo a tudo com um sorriso nos lábios e poucas gargalhadas. Mas para o ator de comédia, a gargalhada é sempre muito importante. É um termômetro do trabalho.


        TÓPICO 11 - A Explosão do Riso

O riso é uma reação física. É como o corpo reage ao que é ouvido ou visto. A gargalhada vem como uma explosão física mais intensa. Acho muito interessante quando vejo pessoas na plateia que não se seguram ao verem algo engraçado e acabam não controlando o riso, o que é muito bom para os atores que estão fazendo o espetáculo, pois percebem que estão provocando reações inesperadas. Aí o termômetro está respondendo melhor. Está medindo perfeitamente o tempo da piada.

Isso é bem similar ao processo de querer dançar uma canção. Primeiro você recebe aquela canção. Se ela te toca de alguma forma, você se joga nela e sai fazendo passos, demonstrando o prazer que aquela canção te dá. Tanto que, na pista de dança, quando se coloca uma canção que não agrada muito, o público se retira. Deixa a pista vazia. Assim acontece quando a piada não agrada. Se ninguém rir, isso é um sinal para abandonar a piada. E o mesmo acontece com o aplauso. O que é o aplauso? É a necessidade de demonstração de que aquilo que você viu ou ouviu te tocou de tal maneira que você tem que dizer isso, da forma como o público responde ao que gosta, aplaudindo.  

       TÓPICO FINAL - Conclusão

Na verdade, a ideia desse texto veio da necessidade de explanar sobre o que penso disso que é meu ofício: a comédia. Foram tópicos que estavam há um tempo no computador e que habitam minha cabeça no tempo em que estou criando e exercitando, seja como autor, diretor ou ator. E acredito que trocar dois dedos de prosa sobre isso é sempre algo benéfico no sentido de estamos construindo um pensamento sobre nossa comédia brasileira. E como hoje a comédia está em alta, esse texto serve bem ao momento em que vivemos, já que muitos atores estão descambando para esse lado. E, com o advento do stand up comedy, não-atores também estão criando seus próprios textos e os levando para os palcos da vida, com o único intuito de fazer rir. Muitos conseguem com maestria.

Então, vamos aplaudir esse momento e pegar o que escrevi como trampolins para novas ideias de humor.

Estamos aí na atividade! 

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Questões sobre Teatro



Mexendo em um cd velho, com arquivos meus, deparo-me com umas questões sobre teatro. E lendo a pequena  entrevista, tento me recordar quando respondi a essas questões. E recordo que foi o ano de 2006. Uma amiga minha, Mariana, pediu-me para responder a algumas questões para um trabalho seu na faculdade de artes cênicas. E como achei bem legal rever isso, disponibilizo aqui para vocês, porque mesmo tendo passado alguns anos, muito do que está respondido aqui, tem a ver com o meu pensamento sobre as artes cênicas.

Segue, na íntegra, as perguntas e respostas:


  1. Fale um pouco da sua trajetória no teatro e sobre o que você está fazendo agora
- Eu comecei a fazer teatro bem novo, no colégio, com 9 anos, em Belém do Pará. Foi uma peça chamada Saci Pererê, no qual eu fazia o próprio. Não tinha fala. Tinha uma narração e eu entrava saltando com o cachimbo na boca. Gostei muito. Depois continuei a fazer peças no colégio até entrar para o grupo de teatro do próprio colégio, em 1985, quando eu estava com 11 anos. E fizemos uma peça chamada Circo de Brinquedos que foi uma ótima experiência, pois eu fazia um leão medroso e que em um certo momento eu dublava uma música dele. E tinha tudo a ver comigo, pois desde pequeno eu fazia dublagens de artistas que eu gostava. Até hoje lembro de muitos detalhes do processo. Inesquecível, pois foi um primeiro contato com todas as etapas de uma produção de um espetáculo teatral. E depois disso não parei mais. Continuei fazendo teatro direto. Espetáculos diversos e também encenação de poemas. Em 1997 eu vim para o Rio de Janeiro e passei a me dedicar direto ao teatro, fazendo espetáculos infantis e outras coisas. Em 1999 entrei para a Uni-Rio, onde fiz artes cênicas - interpretação. Dentre as peças que fiz estão obras como Inspetor Geral, de Gogol; Capitães de Areia, de Jorge Amado; Cafute e Pena de Prata, de Raquel de Queiroz; Nossa Cidade, de Thorton Wilder; O visitante, de Hilda Hilst; O último Carro, de João das Neves; Don Juan, de Molière e outras. Além de ator, eu também escrevo e dirijo. Acabei de dirigir agora um espetáculo de humor chamado Co-média Pão com Manteiga. E também voltarei em cartaz em agosto com a peça Fama Zero escrita e dirigida por mim. Estou em cartaz como ator na peça Tubo de Ensaio, no Candido Mendes.      


2. Até agora qual trabalho você mais gostou de fazer? Porque?
- Muitos trabalhos são especiais. Têm a sua importância. Amei fazer Don Juan, por exemplo, porque era o personagem que eu mais queria fazer na vida: Sganarelo, criado de Don Juan. Por ter esse desejo, acho que tornei a experiência marcante. Na Cama com Tarantino foi outro trabalho muito especial porque brincava com a estética pop do diretor Quentin Tarantino. E eu fazia um personagem chamado White que era um assaltante de banco. Esses dois trabalhos foram extremamente interessantes para a minha carreira. 

3. E o mais inusitado?
- Acho que entre os mais inusitados estão aqueles esquisitos, tipo animação de festa infantil. Não são bem trabalhos teatrais, mas são formas de descolar um troco. Teve uma festa na Barra que eu fiz o Tarzan. Aí o organizador da festa perguntou se eu poderia escalar o muro da casa para ter uma entrada triunfal. Eu topei. Ralei todo o braço, mas foi divertido. Fiquei de tanga a festa inteira, mas todos gostaram. E eu voltei pra casa com dinheiro na mão, rindo de tudo. Que coisas fazemos nessa vida, né???!!!

4. O que você mais admira em um ator?
- Admiro muito o ator versátil. A capacidade de criação. De aprimoramento. De olhar atento para a alma humana e conseguir extrair percepções para serem usadas na hora de se criar um personagem.

5. Em quais atores de teatro você se espelha?
- No começo de carreira eu me espelhava muito no Diogo Vilela. Ele tinha uma interpretação visceral que me fascinava. Algo meio nervoso e tal. Mas isso muito em função da TV Pirata que eu assistia. No teatro o vi em “Solidão, a comédia” e fiquei maravilhado. Era um monólogo fantástico. E antes disso, muito me chamava atenção o Ney Latorraca, por causa das suas interpretações nas minisséries Memórias de um gigolô, Rabo de Saia e na novela Um Sonho a Mais. Hoje curto muito o Marco Nanini. 

6. O que você mais gosta de fazer, atuar, dirigir ou escrever?
- Pergunta crucial! Se eu só pudesse ficar com uma coisa, eu ficaria escrevendo. Se pudesse fazer duas coisas, eu escreveria e dirigiria. Por último, atuar, por incrível que pareça.

7. Você possui uma linha de trabalho ou procura diversificar
- Acho o meu trabalho muito específico. Os trabalhos que escrevi e dirigi tem muito a minha cara, ligada a comédia. Mas já fiz coisas bem autorais ligadas ao drama, a uma coisa mais profunda e dolorosa que eu também adorava fazer. Atualmente tenho estado ligado a comédias, a espetáculos de esquetes e tal. Mas estou com vontade de fazer outras coisas mais performáticas, com outras linguagens.

 
8. A maioria dos atores de teatro fazem algum trabalho paralelo a arte para poderem se sustentar,  você acha que talvez falte incentivo ao artista brasileiro?
- Muito. Falta um monte de coisa. O artista brasileiro não tem muita formação. Ou melhor dizendo, a formação é muito precária. A gente aprende muitas coisas, às vezes, na prática. Ou fazendo ou olhando os outros fazendo. Por isso que gostaria de sugerir uma lei que permitisse também que o ator pagasse meia entrada no cinema. Porque o cinema também serve como forma de estudo para nós. O que o artista brasileiro deve fazer é correr mais atrás, se preparar da melhor forma possível. Porque no Brasil as coisas são muito precárias em diversas áreas, ainda mais no plano artístico.
 
9. O que é fundamental para um ator?
Observação acima de tudo.  Buscar informação sempre. Cultura geral nunca é demais. Por isso é importante ampliar o leque de estudo porque nunca se sabe o personagem que irá se encontrar pela frente. 

10. Como vc vê o teatro na educação brasileira?
- Tem uma importância fundamental. Eu quando estudava Ciências Sociais, desenvolvi um projeto chamado O teatro e a antropologia – uma perspectiva de educação, que visava tratar de temáticas antropológicas através do teatro. Foi uma experiência muito interessante que teve um efeito positivo. Porque abre o foco de observação. Você consegue apreender mais coisas porque sai um pouco da sala de aula. Assim como projetos teatrais dentro da escola são importantes, porque trabalha a formação da platéia que é muito importante.   

11. Você ja fez algum tipo de projeto social? Como foi?
- Já trabalhei com projetos ligados a prefeitura do Rio de Janeiro, onde fiz alguns espetáculos encomendados com o intuito de festejar datas comemorativas. Foi o caso do espetáculo Assim Descobriram o Paraíso que era um espetáculo que falava, com muito bom humor, da chegada dos portugueses aos Rio de Janeiro. Esse espetáculo foi apresentado no Complexo do Alemão, Rocinha e outros lugares. A experiência foi boa porque eram comunidades carentes que responderam muito bem ao espetáculo. O meu outro espetáculo, chamado O mundo mágico dos livros também fez o circuito de bibliotecas populares. E foi interessante porque é um espetáculo que incentiva a leitura. E, ao final, sempre distribuíamos livros.

12. Diga pontos positivos e negativos de se fazer teatro no Brasil?
- Antes de mais nada, acho que todo mundo deveria fazer teatro, não só para virar ator, mas para desenvolver o espírito de grupo, de realizar jogos de criação e tudo. É uma boa terapia que nos permite aprender mais sobre nós mesmos. Isso é um ponto positivo, independente de ser no Brasil ou qualquer outro país. Fazer teatro também é bom porque nos coloca em contato com os mais diversos tipos de pessoas e não temos o problema de rotina, porque em cada grupo o processo é diferente. Agora o negativo é a velha coisa: é muito difícil sobreviver da profissão. Se não formos um ator da Globo, passaremos fome. Ser ator só de teatro no Brasil é muito complicado. Não dá pra sobreviver.


13. Você estava com uma peça de Nelson Rodrigues, fale um pouco da peça e de como foi montar Nelson
- Todo ator brasileiro deveria por obrigação fazer um Nelson. Eu confesso que nunca pensei em fazer um Nelson Rodrigues. Sempre amei ler os seus textos, as crônicas para os jornais e tudo. Mas nunca pensei em encena-lo, até porque tinha visto poucas coisas interessantes em termos de montagem. Sempre achava tudo muito gritado. Mas quando fui convidado para fazer Bonitinha Mas Ordinária não pensei duas vezes. Aceitei. E foi o máximo, porque Nelson é sempre intrigante. E nossa encenação brincava com ritmos da fala e optava por não fazer uso de nenhum cenário, só o ator em si, vivo em cena. Isso me motivou mais ainda. E vi o quanto ficou engraçada a peça. O quanto Nelson tem um humor surpreendente. E como eu estava em crise como ator, no sentido de questionamentos da profissão e outras dúvidas, acredito que fazer essa peça me deixou forte e ciente de que montar bons textos é fundamental.   


14. O que você diria para alguém que está iniciando a carreira de ator?
- Desista. E se a pessoa vier me perguntar de novo, eu direi: desista. E, se mesmo assim, a pessoa, correr muito atrás e não ligar por que eu digo, aí sim verei que ela tem vocação. Afinal, eu mesmo já ouvi de diversas pessoas isso: DESISTA!!! 


15. Você um dia me perguntou o que é ser ator. Para você o que é?
- Todo o dia quando acordo me pergunto: o que é ser ator? E tento responder todos os dias. Pra mim, ser ator é muita coisa. Além de decorar, é estudar o personagem. É brincar de ser Deus: porque criamos novas vidas. É emprestar a uma idéia de um personagem, nosso corpo e voz. É poder surtar diante de todos e ainda ser aplaudido. É poder ser louco em cena e receber o aval do público. É ser um apaixonado, um poeta da cena. Um Don Quixote eterno. É algo muito sério e fascinante. E concluo, dizendo que não é pra qualquer um, por mais que a cada dia muitos se arvorem a seguir essa profissão.